Maculelê

Era em Santo Amaro da Purificação, no recôncavo  baiano, que se dançava o Maculelê, dentro das   celebrações profanas locais, comemorativas do dia de  Nossa Senhora da Purificação (2/Fev.), a santa   padroeira da cidade. No restante  do  estado da Bahia,  desconhecia-se  o folguedo.  Essa manifestação de forte expressão dramática, ponto alto  dos folguedos  populares, destinava-se a  participantes do sexo masculino que dançavam em grupo, batendo as grimas (bastões) ao ritmo dos atabaques e ao som de cânticos em linguagem popular, ou em dialetos africanos. Originalmente, o Maculelê era coreografado em círculo, com uma dupla de participantes dançando no centro, comandada pelo mestre. Atualmente, adaptou-se a dança para exibições folclóricas.

O Maculelê passou  a  ser  coreografado  com uma entrada em fila indiana e com os figurantes fazendo evoluções em duplas. Dentre todos os folguedos existentes em  Santo Amaro, cidade marcada pelo verde dos canaviais, o Maculelê era o mais rico em cores. Seu ritmo vibrante contagiava a todos.
De  impressionante  efeito  plástico, o  Maculelê  pode  ser  coreografado  com  bastões,  facões  ou até com bastões terminando em chamas. Os  participantes  se  presentam com vistosas fantasias e pinturas pelo corpo, inspiradas nas tribos africanas. A fantasia do Maculelê  conta  de  uma  espécie de  sarongue  feito  om um tipo de "palha". Ao centro, participantes se apresentam com os rostos cobertos pelo mesmo material. Com os troncos nus,  os f igurantes  do Maculelê  ganham  maior  amplitude  de  movimentos para a prática  da dança.  Há quem diga que  o Maculelê era um divertimento que os escravos praticavam nas senzalas, mas na verdade, são contraditórias  e  pouco  esclarecidas suas  origens. Tem-se  como  um ato popular de origem africana que teria florescido no século XVIII nos canaviais  santo-amarense  e que se integrara, há mais de duzentos anos, nas comemorações daquela cidade. Um dos seus registros mais significativos consta de nota fúnebre publicada pelo jornal "O Popular" (10/Dez/1873), que circulava em Santo Amaro: "Faleceu no  dia  primeiro  de  dezembro  a  africana Raimunda Quitéria, com a idade de 110 anos. Apesar da idade, ainda capinava e varria o adro (terreno em volta) da igreja da Purificação, para as folias do Maculelê.
No início deste século, com  a morte dos grandes mestres de Maculelê daquela cidade, o folguedo começou a desaparecer, deixando de constar, por muitos anos, das festas da padroeira. Em 1943, outro mestre, Paulino Aluísio de Andrade, conhecido como Popó do Maculelê  e  considerado  como  "pai do Maculelê,  no Brasil", reuniu parentes e amigos para ensiná-los a dançar, com base nas suas lembranças, pretendendo  inclui-lo  novamente  nos festejos  religiosos locais. Seu grupo passou a ser conhecido como "Conjunto de Maculelê de Santo Amaro".

A respeito,  a  pesquisadora  Hildegardes Vianna  chama  à  atenção  para  uma  remota  eferência quanto a existência de  "uma dança esquisita de  gente  preta da roça,  que  aparecia  nos  festejos  de N. S. da Purificação". Entretanto, é através dos estudos de Manoel Querino (1851-1923) que se encontram indicações de tratar-se o Maculelê de  um fragmento  de Cucumbi, uma dança dramática em que  os  negros  batiam  pedaços  roliços  de madeira, acompanhados por cantos. Em seu "Dicionário de Folclore Brasileiro", Luís da Câmara  Cascudo  aponta  a  semelhança  do Maculelê  com os Congos e Moçambiques. Emília Biancardi escreveu um livro de título "Olelê Maculelê", considerado como um dos estudos mais completos sobre o assunto.
Os exemplos acima citados já servem para demonstrar o grau de incerteza que persiste com relação às possíveis interpretações sobre os primórdios  do Maculelê.  Mesmo  considerando  que  já não vivem os praticantes primitivos dessa dança, devem por certo existir ainda valiosos documentos inéditos  com  dados  esclarecedores,  para subsidiar elaboração de hipóteses mais consistentes a respeito dessa manifestação, tão pouco estudada nos dias de hoje.