1548: Começam a ser desembarcados no Brasil os escravos negros, vindos principalmente dos portos de São Paulo de Luanda, em Angola, e Benguela.

Os escravos negros começaram a ser desembarcados no Brasil por volta de 1548 e, nos três séculos seguintes, seriam predominantemente do tronco lingüístico banto, do qual faz parte a língua quimbundo. Esse grupo englobava angolas, benguelas, moçambiques, cabindas e congos. Eram povos de pequenos reinos, com um razoável domínio de técnicas agrícolas; possuíam uma visão muito plástica e imaginosa da vida, e demonstraram ter grande capacidade de adaptação cultural.

Não há indicações seguras de que a capoeira se tenha desenvolvido em qualquer outra parte do mundo além do Brasil. "A tendência dos historiadores e africanistas, tomando como base poucos e raros documentos conhecidos, é se fixarem como sendo de Angola os primeiros negros aqui chegados, tendo a grande maioria de nossos escravos escoado dos portos de São Paulo de Luanda e Benguela. Ao lado disso, a gente do povo e sobretudo os capoeiras falam todo o tempo em capoeira Angola, especialmente quando querem distingui-la da capoeira Regional. Ora, tudo isso seria um pressuposto para se dizer que a capoeira veio de Angola, trazida pelos negros de Angola. Mas, mesmo que se tivesse notícia concreta da existência de tal folguedo por aquelas bandas, ainda não seria argumento suficiente. Está documentado e sabido por todos que os africanos uma vez livres e os que retornaram às suas pátrias levaram muita coisa do Brasil, coisas não só inventadas por eles aqui, como assimiladas do índio e do português. Portanto, não se pode ser dogmático na gênese das coisas em que é constatada a presença africana; pelo contrário, deve-se andar com bastante cautela." (Waldeloir Rego - Capoeira Angola)

1577: Primeiro registro do vocábulo Capoeira na língua portuguesa: Pe.Padre Fernão Cardim (SJ), na obra: "Do Clima e da Terra do Brasil". Conotação: vegetação secundária, roça abandonada.

1597: "Numa noite qualquer do ano de 1597, quarenta escravos fugiram de um engenho no sul de Pernambuco. Fato corriqueiro. Escravos fugiam o tempo todo de todos os engenhos. O número é que parecia excessivo: quarenta de uma vez. Fora também insólito o que fizeram antes de optar pela fuga coletiva: armados de foices, chuços e cacetes haviam massacrado a população livre da fazenda. Já não poderiam se esconder nos matos e brenhas da vizinhança - seriam caçados furiosamente até que, um por um, tivessem o destino dos amos e feitores que haviam justiçado.

De manhã, certamente, a notícia correria a Zona da Mata - essa formidável galeria verde que, salpicada de canaviais, a uns dez quilômetros do mar, o acompanha sem nunca perdê-lo de vista. Tinham a liberdade e uma noite para agir.

Havia umas poucas mulheres, um que outro velho e diversas crianças, mas o grosso eram pretos fortes, canelas finas e magníficos dentes. Escolheram caminhar na direção do sol poente, um pouco para baixo. Com duas horas compreenderam que jamais qualquer deles havia ido tão longe naquela terra. Mesmo os crioulos, nascidos aqui, desconheciam o pio daquelas aves, nunca tinham visto aqueles cipós. Andaram toda a noite e a manhã seguinte; descansaram quando o sol chegava a pino; contornaram brejos e grotões, subiram penhascos e caminharam, um a um, na beirada de feios precipícios.

Se passou ainda uma noite. Eram observados, mas não tinham qualquer medo de índios. Então, na vigésima manhã se sentiram seguros. De onde estavam podiam ver perfeitamente quem viesse dos quatro cantos; com boa vista se podia mesmo vislumbrar o mar, além das lagoas. A terra, vermelho-escura, esboroava ao aperto da mão. Ouviam águas correndo sobre pedras. E havia palmeiras, muitas palmeiras.

Por que escravos fugiam? A fuga era a única maneira de recuperarem a sua humanidade - esta é a melhor resposta que conheço."

Assim descreve Joel Rufino dos Santos, em seu livro Zumbi (ed. Moderna, 1985), o episódio que teria dado origem ao quilombo dos Palmares, na Serra da Barriga (que tem esse nome "talvez por parecer grávida a quem vem de Maceió, pelo Vale do Mundaú"), em Alagoas, onde é hoje o município de União dos Palmares.

1630: No topo da majestosa Serra da Barriga, eram já três aldeias muito bem organizadas. Os moradores as chamavam Angola Janga, que no idioma quimbundo significa "Angola Pequena".

1640: Início das invasões holandesas. Desorganização social do litoral brasileiro. Evasão dos escravos africanos para o interior do Brasil. Aculturação afro-indígena. Organização de centenas de quilombos. Surgem as expressões: "negros das capoeiras", "negros capoeiras" e "capoeiras".

1654: Com a expulsão definitiva dos holandeses, o "grande inimigo externo", todas as forças da sociedade colonial brasileira se voltaram contra o temível "inimigo de portas adentro", os negros palmarinos. A partir de então, quase não houve um ano em que não partisse contra eles alguma expedição, vinda de Recife, Porto Calvo, Penedo ou Alagoas. Em geral, eram de iniciativa das autoridades, mas os recursos partiam dos senhores de engenho.

1655: Em algum ponto dos Palmares, nasceu livre a criatura que chamamos Zumbi. Neste ano, um certo Brás da Rocha atacou Palmares e carregou, entre presas adultas, um recém-nascido. Entregou-o ao chefe de uma coluna, e este decidiu presenteá-lo ao cura de Porto Calvo. Padre Melo resolveu chamar o negrinho de Francisco. O menino cresceu junto ao padre, que lhe ensinou português, latim e religião. Numa noite de 1670, ao completar quinze anos, Francisco fugiu.

1670: Zumbi, como agora se chamava o jovem Francisco, chega a Palmares, que, naquela época, eram já dezenas de povoados, cobrindo mais de seis mil quilômetros quadrados. Ganga Zumba, que significa "Grande Chefe", reinava sobre todos eles.

1672: Zumbi assume o posto de chefe da aldeia mais próxima de Porto Calvo.

1677: O comando geral do exército negro cabia já a Zumbi, promovido de simples chefe de aldeia, após uma série de derrotas humilhantes de Ganga Zumba diante dos soldados de Fernão Carrilho.

1678: Ganga Zumba entra em Recife para ratificar um acordo de paz com o governo. Zumbi, acompanhado dos chefes de mocambo descontentes, marchou contra a aldeia de Macaco, a capital de Palmares, onde se encontrava Ganga Zumba. Este fugiu, com pouco mais de trezentos fiéis, para Cucaú, no sul de Pernambuco, onde o governo colonial lhe reservara terras para viver e cultivar. Entretanto, a paz firmada entre Ganga Zumba e o governador D. Pedro de Almeida não durou dois anos.

1680: Ganga Zumba morre envenenado por adeptos de Zumbi que se infiltraram no Cucaú. O governador de Pernambuco socorreu-o tarde demais, apenas a tempo de executar sumariamente os conspiradores João Mulato, Canhongo e Gaspar. Os sobreviventes da triste experiência da secessão de Palmares foram reescravizados. Durante os quinze anos seguintes, travou-se a guerra total na Zona da Mata, entre Zumbi e o mundo dos senhores de engenho. Cada golpe provocava outro, do lado contrário.

1687: Neste ano, Zumbi fartou-se de derrotar tropas colonialistas, regulares ou não. Invadiu São Miguel, Penedo e Alagoas. Humilhado, o mundo do açúcar resolveu então contratar Domingos Jorge Velho, o caçador de índios, para lutar contra os quilombos.

1693: Foi um ano terrível: com a queda absoluta do preço do açúcar, o ouro da colônia desapareceu quase que completamente, e a inflação explodiu. A seca e a fome, que já penalizavam o sertão, invadiram as cidades. A plebe, os pobres-diabos que viviam imprensados entre a grande fazenda e o governo (únicas fontes de trabalho), ficaram a pão e água. A raiva e o desespero tomaram conta das ruas do Recife. O governo colonial, preparando-se para uma cruzada definitiva contra o Estado quilombola, explorou então a frustração e a inveja da plebe urbana maltrapilha e faminta: prometeu mundos e fundos a quem participasse da expedição contra os quilombos; esvaziou os presídios, indultando os fora-da-lei; convocou militares vadios da Bahia, da Paraíba e do Rio Grande do Norte. A todos, a propaganda de guerra fez crer que a origem dos males brasileiros era a pátria dos negros.

1694: Em janeiro, uma tropa de nove mil homens se pôs lentamente em marcha, sob o comando de Domingos Jorge Velho, em direção à serra da Barriga. Só na guerra da independência, 130 anos mais tarde, é que se viu um exército maior.

Várias tentativas foram feitas pelos invasores para destruir a fortaleza de Palmares, todas elas fracassadas, até que, na madrugada de 6 de fevereiro, conseguiram finalmente romper a paliçada a golpes de canhão e penetrarem o reduto dos palmarinos. Em sua fúria, a multidão de índios, mamelucos e soldados não deixou nada de pé ou inteiro.

Na beira do abismo, do lado ocidental da fortificação, restou uma passagem que o inimigo não teve tempo de fechar. Por ali saiu um grupo grande de guerreiros, dispostos a recomeçarem a guerra depois, quando se recompusessem. Quando passavam os últimos, rolaram pedras, e os mamelucos abriram fogo sobre eles. Na confusão que se seguiu, perto de duzentos guerreiros palmarinos despencaram no abismo.

Por muito tempo, acreditou-se que Zumbi, num impressionante gesto de orgulho, precipitara-se do alto da serra. Até recentemente, essa era a lenda. "Por que se acreditou tanto tempo nessa mentira? (...) Uma coisa é certa: a legenda do herói étnico que prefere a morte ao cativeiro fascina nossas mentes, charme indiscutível do 'último dos moicanos'."

Zumbi foi um dos últimos a sair, postado na retaguarda da coluna de guerrilheiros que deixou Palmares na madrugada de 6 de fevereiro de 1694. Escapou com vida. Depois, dividiu seus homens (cerca de mil) em bandos, e voltou à guerrilha.

1695: Zumbi é morto em uma emboscada. O chefe de um de seus bandos, Antônio Soares, fora emboscado e preso, passando a cooperar com as forças coloniais em troca da vida e da liberdade.

"Zumbi confiava em Soares, e quando este lhe meteu a faca na barriga se preparava para um abraço. Seus olhos devem ter brilhado, então, de estupor e desalento. Seis guerrilheiros apenas estavam com ele naquele momento - cinco foram mortos imediatamente pela fuzilaria que irrompeu dos matos em volta. Zumbi, sozinho, matou um e feriu vários. Foi isso nas brenhas da serra Dois Irmãos, por volta de cinco horas da manhã de 20 de novembro de 1695."

1696: São descobertos os primeiros veios auríferos. Começa no Brasil a atividade da mineração.

 

1702: Começa no Brasil a atividade cafeeira, com a plantação das primeiras mudas de café por Palheta no Rio de Janeiro, no vale do Paraíba, dirigindo-se daí para São Paulo. No século XVIII, além do açúcar e da recém-implantação da cafeicultura e da mineração, começa efetivamente, com o crescimento das cidades, a vida urbana, surgindo então um outro tipo de escravidão: o escravo doméstico. A partir daí, a alforria começa a ser amplamente disseminada. A presença do negro, sua contribuição para a civilização brasileira, torna-se marcante, não só nas senzalas das plantações ou na mineração, mas também nas cidades, no comércio, nos mercados e nas praças públicas.

1712: Pela primeira vez é registrado o vocábulo capoeira, no Vocabulário Português e Latino, de Rafael Bluteau, mas os significados do termo não se referem à luta.

Não há praticamente registros sobre a capoeira no século XVIII. É comum imaginar-se a capoeira nascendo e crescendo no ambiente rural, mas talvez tenha sido nas cidades, onde circulava livremente um grande número de libertos e "negros de ganho" (escravos que por conta própria exerciam alguma atividade e que ao fim do dia tinham de entregar uma quantia prefixada a seu proprietário), que esse processo de crescimento e transformação foi mais expressivo.

1770: A mais antiga referência de capoeira enquanto forma de luta. "Segundo os melhores cronistas, data a capoeiragem é de 1770, quando para cá andou o Vice-Rei Marquês do Lavradio. Dizem eles também que o primeiro capoeira foi um tenente chamado João Moreira, homem rixento, motivo porque o povo o apelidava de 'amotinado'. Viam os negros escravos como o 'amotinado' se defendia quando eram atacados por quatro ou cinco homens, e aprenderam seus movimentos, aperfeiçando-os e desdobrando-os em outros e dando a cada um seu próprio nome"[Edmundo 1951].

1789 : (25 de Abril de...) Primeira menção da capoeira em registros policias, na prisão de Adão, pardo, escravo, acusado de ser "capoeira [Nireu Cavalcanti, "O Capoeira", Jornal do Brasil, 15 de novembro de 1999, citando do códice 24, Tribunal da Relação, livro 10, Arquivo Nacional, Rio de Janeiro].